terça-feira, 17 de julho de 2012

Reforma da Administração Local- Do Ponto de Vista Territorial





Abstract

“ (…) A expressão “organizar espaço”, à escala do homem, tem para nós um sentido diferente daquele que poderia ter, por exemplo, a expressão «ocupar espaço». Vemos na palavra «organizar» um desejo, uma manifestação de vontade, um sentido, que a palavra «ocupar» não possui e daí que usemos a expressão «organização do espaço» pressupondo sempre que por detrás dela está o homem ser inteligente e artista por natureza, donde resultará que o espaço ocupado pelo homem tende sempre para, caminha sempre no sentido de, tem como fim, a criação da harmonia do espaço, considerando que a harmonia é a palavra que traduz exactamente equilíbrio, jogo exacto de consciência e de sensibilidade, integração hierarquizada e correcta de factores. (…) ”

TÁVORA, Fernando “Da Organização do Espaço”, FAUP Publicações




Palavras Chave: Organização do Espaço, Território, Espaço, Ocupação.



A Reforma da Administração Local é constituída por três pontos fundamentais:1- Reforma de Gestão,2- Reforma de Território,3- Reforma Política do Poder Local, desenvolvendo-se em quatro eixos distintos: 1- Financiamento e Democracia Local; 2- Sector Empresarial Local; 3- Organização do Território; 4- Gestão Municipal e Intermunicipal.

         
       A presente Reforma da Administração Local contém em si vários pontos de actuação, como é visível no esquema acima. Ou seja, a RAL é um conjunto indissociável de questões de poder local, ligados às freguesias e municípios, envolvendo as CIM`S (Comunidades Intermunicipais) e Regiões (ex. Região do Vale do Tâmega e Sousa). Não se ficando por aqui, tal reforma, actua sobre a gestão do município e áreas de domínio financeiro, administrativo e territorial. Tal conteúdo permite-nos vislumbrar um processo rizomático de alterações substanciais no domínio do poder local, como processos de junção de freguesias e municípios que alteraram o mapa administrativo.
     Contudo os eixos de actuação diversos e diversificadores, no documento verde, apresentam uma estrutura comum “Sustentabilidade financeira, regulação do perímetro de actuação das autarquias e mudança do paradigma de gestão autárquica.” (documento verde, pág. 6)
    Neste caso em particular focar-me-ei no domínio territorial, um dos pontos da Reforma.



 Organização do Território


1ª Parte
     Na análise das consequências directas que a Reforma da Administração Local (RAL) terá sobre o território e urbanismo é necessário recorrer a uma breve leitura do significado do processo urbanístico.
     O primeiro grande processo de territorialização a surgir no mapa  Europeu foi no império Romano (Séc. I, II e III), com a conquista de território fora de Itália, em que o principal processo de comunicação era a construção de vias de comunicação (estradas) e de infraestruturas, garantias de uma conquista territorial sustentável.

  No caso   Português o período pós 25 de Abril vislumbrou um exponencial crescimento de habitação colectiva, identifique-se o programa SAAL (Serviço de Apoio Ambulatório) como um processo de construção massiva de habitação social. Verificava-se nos primeiros anos de democracia, em Portugal, a falta de habitação e por isto o caminho estava aberto à multiplicação de infraestrutura, a par do crescimento das cidades. O país na entrada, anos após, para a União Europeia vislumbra a continuação de investimento em infraestrutura “pesada”, como aeroportos, portos marítimos, auto-estradas, entre outros. E naturalmente com o programa de investimento da CEE, surge a aposta na construção de Etar´s, ETA´S, Campos de Futebol, Hospitais, Escolas, entre muitos outras infraestruturas. No caso de estudo de Marco de Canaveses identifica-se um crescimento urbano em meados da década de 90, com a construção de infraestrutura financiada pela CEE e factores económicos com a instalação de fábricas têxteis no concelho. Nesta fase a cidade do Marco cresce dentro de um urbanismo selvagem sem um programa urbano claro, traduzindo-se na densificação de uma cidade sem identidade urbana e arquitetónica e sem uma disciplina na ocupação do território.
   
 O território planeado metaforicamente aproxima-se de um tabuleiro de xadrez, com regras bem definidas e uma estrutura identificada à priori. A infraestrutura, indissociável da urbanização, surge como damas dispostas a actuarem num território identificado. A Reforma da Administração Local deverá promover o debate intenso dos novos paradigmas do planeamento urbano. De momento o Marco de Canaveses vislumbra duas obras de impacto urbano: o Parque Fluvial do Tâmega e a renovação do centro da cidade. Ambos os projectos devem ser atenciosamente identificados como fundamentais na implementação de rigor territorial, destacando-se como obras de um conjunto. Sendo fundamentais para promoverem um crescimento da cidade de forma sustentável para a baixa junto ao Rio Tâmega, promovendo, inclusive, novos usos dos espaços.
  
                           





Conclusão 1:

       A reforma da Administração Local é tardia e por isso não terá a curto prazo um forte e benéfico impacto na territorialização. No que o processo de discussão territorial deverá ser realizado sempre antes da colocação da infraestrutura no espaço. Isto é, as autarquias deverão ter a capacidade de discernir qual a infraestrutura necessária a aplicar. No que antes da construção de uma autoestrada deverá ter atenção às áreas de ocupação e real necessidade. Hoje o território português está equipado com diversificadas infraestruturas que deverão ser reavaliadas quanto ao uso e necessidade. E a RAL poderá propiciar o mapeamento de infraestruturas, comunidades, instituições existentes no concelho. As próprias comunidades intermunicipais serão factores decisivos para as boas práticas de partilha de infraestrutura entre autarquias. Compondo uma mais-valia para os laços populacionais, económicos e de parcerias regionais. A inter-municipalização deverá ser encarada como uma realidade mais do que necessária.





2ª Parte
“ (…) uma instalação industrial mal implantada pode alterar totalmente, por exemplo, os valores dos terrenos envolventes, pode criar problemas de acessos e do tráfego, pode provocar a disseminação caótica da habitação, pode alterar toda uma paisagem, pode prejudicar, pela produção de cheiros ou fumos, todo um aglomerado, pode ocupar terrenos ideias para outro tipo de ocupação, etc., e estes inconvenientes podem tomar tais valores que essa instalação, criada com a intenção de favorecer o desenvolvimento económico, seja pura e simplesmente antieconómica.”
TÁVORA, Fernando “Da Organização do Espaço”, FAUP Publicações


    O território de Marco de Canaveses tem características próprias que devem ser analisadas com prudência e tempo, o concelho é caracterizado por uma urbanização dispersa (Território de Urbanização Dispersa) e monofuncional e o comércio vive fundamentalmente dos serviços. Característica muito comum à zona Norte, que de forma prática tem consequências directas na sua administração, reconheça-se que é redobrado o trabalho de iluminação pública, pavimentação e serviços básicos. Note-se que o concelho ainda continua com um défice de saneamento básico, não chegando ainda a muitos aglomerados populacionais. Consequência directa da dispersão de habitação pelo concelho.

             


Conclusão 2:

      A fusão de freguesias no Marco de Canaveses deverá ter durante o processo e após, uma discussão pragmática que aborde, por exemplo, as áreas de construção legais e as zonas de reserva florestal apelidadas no vulgo de “zonas verdes”. A RAL não é um processo encerrado mas contínuo que levará décadas a cumprir os ditames de uma actualizada organização territorial. Note-se que a não renovação do PDM é um factor prejudicial e incoerente para a implementação de uma reforma de predomínio territorial eficaz. No caso do Marco de Canaveses deverá ser fortemente criticado a não actualização do PDM, pois é perigoso para o território do Marco e futuros investimentos a realizarem-se no concelho. No futuro com a agregação das freguesias e de núcleos sub-urbanos é previsível uma disseminação nefasta de vilas. Um risco evidente que o concelho do Marco deverá passar por combater, contribuindo para uma homogeneização de ocupação territorial, sem uma pretensa hierarquização de modelos urbanos exacerbados. O PDM será um dos importantes instrumentos de controlo urbanístico na cidade.





3ª Parte
 O território Português aparenta continuar com um sintoma de macrocefalia, isto é a distribuição de poderes administrativos parece continuar circunscrita à Região de Lisboa. Afastando de Portugal uma homogeneidade, por exemplo, de investimentos de infraestrutura e de poder regional e distrital. Geograficamente a macrocefalia é impiedosa e recria um país desajustado. Portugal assiste no primeiro quartel do século XX a uma alteração morfo-geográfica substancial. O país deixa de ser transversal e passa a longitudinal. Antes a transversalidade era garantida pela direcção dos principais rios (Rios Douro e Tejo). As regiões do vale do Tejo e Douro eram distribuídas pelos afluentes, era pelo Rio Douro, canal comercial, que passava o vinho do Porto e os principais produtos agrícolas que iriam abastecer o Porto. Contudo no século XX existe, naturalmente uma mudança de paradigmas e o país compõe-se no litoral abandonando as suas regiões produtivas como Alto Douro, Ribatejo e Alentejo. Agora os produtos chegavam ora de avião ora de navio e o mar e ar alteravam a economia do país, aqui Portugal começa a tornar-se dependente com as importações a crescerem.
 Hoje o interior reclama direitos perdidos e obviamente a sua dignidade de regiões plurais e produtivas, outrora atractivas e promotoras de uma distribuição demográfica controlável. Hoje a RAL não aborda as diferenças do interior, do litoral, do norte do centro e sul. E como se verificou o território do norte é diferente do sul, com características próprias, o litoral é desigual do interior, mas isso não é dialogado na esfera da Reforma da Administração Local.
                                         



Conclusão 3:

Assistiu-se à reforma do mapa hospitalar na governação de José Sócrates e assiste-se hoje à reforma do mapa judicial, ambas as reformas têm a legibilidade de fazerem parte da discussão da RAL, o que não é o caso. Lamentavelmente o território Português avista profundas mudanças completamente díspares e com consequências nefastas se não forem abordadas como um conjunto. Nota-se que a subserviência perante os programas de ajustamento económico levam a discussão territorial portuguesa para um lugar perigoso. Concluindo-se que a RAL não tem como pretensão a criação de um território sustentável e positivo para o comércio, indústria, e ocupação de território mas a implementação de uma reforma sob um colete-de-forças sem identidade. Mas nem tudo está perdido e o poder das comunidades intermunicipais parece intensificar-se e é nesses seios que as discussões de domínio territorial-urbanístico deverão efetivar-se, caso contrário o país perde uma ocasião para um debate alargado da ocupação do seu território e novos modelos de territorialização eficientes e que dêem resposta a desajustes maiores.
  No que concerne ao ponto da territorialização a RAL simplesmente aborda o número populacional com base nos censos, uma forma pecaminosa e redundante na percepção e compreensão do território. A fusão de freguesias deverá efectivar-se não e somente pelo aspecto contabilístico do nº populacional mas também pela capacidade de infraestrutura nelas existentes. Percebendo-se que para contribuir para um território homogéneo é necessário saber-se em detalhe o número de associações existentes num determinado local, qualidade de serviços, qualidade de infraestrutura para uma fusão capacitada de fazer gerar um concelho mais eficiente.

(Continua)

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