quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Quais as razões porque sou candidato em Marco de Canaveses? por Lino Tavares Dias


Sou arqueólogo há mais de trinta anos.

Um dia, em 1980, fui desafiado a vir do Porto até uma pequena aldeia do Marco de Canaveses, para analisar um sítio onde diziam aparecer “trastes antigos”.

Alguns dias depois, foi com naturalidade que iniciei escavações arqueológicas num lugar aparentemente inóspito dessa aldeia com o topónimo Freixo.

Os trabalhos de investigação nunca mais pararam até hoje. Na aldeia do Freixo foi sediado o laboratório, embora o estudo tenha sido ampliando aos concelhos envolventes, incluindo os da margem esquerda do rio Douro.

Um dia, corria a primavera de 1989, um amigo percorreu comigo as ruínas de Tongobriga, cidade romana que a minha equipa continuava a desenterrar no Marco de Canaveses.

No dia seguinte, esse meu amigo (Luís Varela) ofereceu-me um poema a que deu o título:

AS MÃOS DO ARQUEÓLOGO
Trazem-nos o sol doutros séculos,
Outra luz, pequenos hábitos, rituais.
Revolvem memórias, desvendam
Matérias, leem a vida
De que só tínhamos os sinais.
Vão por dentro do tempo:
Perscrutam as vozes adormecidas
Onde aprendemos a nossa voz.
Escrevem um poema de areia fina
Sobre a cidade que há no futuro.

Neste poema estão evidenciados, de forma implícita, os desafios que me levaram a aceitar o convite do partido Socialista para me candidatar no Marco de Canaveses, cerca de 33 anos depois de aqui ter começado a trabalhar.
No poema que o meu amigo escreveu,
Está o tempo – está a vida do homem ao longo dos séculos, a maturidade
Está a luz - o conhecimento,
Está o homem no seu quotidiano, nos hábitos, na crença de cada um e nos ritos coletivos que procura nas religiões.
Está a memória. Todos nós gostamos de estar bem de memória e de bem com as memórias.
Está a reflexão indispensável ao bom senso porque perscrutamos, escutamos e lemos os testemunhos e os exemplos ao longo dos séculos que nos ajudam a pensar.
Está a experiência da observação que nos permite ter opção de gosto - ser bonito ou feio.
Tudo isto é importante porque o conhecimento e a experiência ajudam a melhorar a nossa voz.
Mas esta aplicação do conhecimento e da experiência é assumida como poema escrito em areia fina, o que é uma salvaguarda inteligente, porque todas as propostas feitas pelo homem são por natureza temporárias, frágeis, com certezas sujeitas a retificações e a alterações mais ou menos subtis.
É a natureza da fragilidade da vida que nos exige que a respeitemos muito, e que, por mais milenar que ela seja, nos aconselha a recusar a existência de homens providência que nunca se enganam e raramente têm dúvidas.
E a materialização das ações deve ser na cidade que há no futuro, não só assumindo a cidade como sinónimo de território organizado mas também, e principalmente, como espaço e modelo em que o cidadão, assumido como indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos, exerce a cidadania e, ao fazê-lo através do voto, está a intervir no futuro.
Ou seja, todo o trabalho de estudo, de investigação, de reconhecimento das estratégias milenares aplicadas ao território é interessante, mas só será importante se tiver perspetiva de futuro, se lançar desafios e se permitir lógicas prospetivas que suportem simultaneamente estratégias para as Pessoas e para o Território.

Ao longo de mais de três décadas tenho incidido o trabalho como investigador sobre um território vasto em que também se insere o Marco de Canaveses, mas que vai para além dele, indissociável de Montemuro e do Marão, do Tâmega e do Douro, assumindo a bacia do rio Douro, desde a nascente em Castela/Leão até à Foz.
A importância geoestratégica que este território teve desde a presença romana, desde há 2000 anos, é fundamental para percebermos melhor as dinâmicas e os desafios dos nossos dias. E, podem crer, é mais fácil desenvolver políticas quando conhecemos bem as fases e etapas da lenta construção destas paisagens, destes territórios milenares em que os rios servem como verdadeiras espinhas dorsais,
Se este é um território sobre o qual houve preocupações na antiguidade, atualmente deve ser um espaço entendido como suporte de pensamento, de investimento e até de inovação
Este é, também, um território que induz a internacionalização. Se é vulgar assumir-se a relação com a Galiza, neste caso facilmente suportada pelas estradas romanas e medievais que serviram as peregrinações a Santiago, e que continuam a poder ser percorridas, também a bacia do rio Douro induz a relação de proximidade com Castela/Leão.
Temos em evidência os valores patrimoniais que suportam esta leitura cultural do território e que potencia o turismo.
O Marco de Canaveses e a envolvência em que se integra, tem que ser um espaço em que se assuma, como prioridade, o respeito pelo Território e pelas Pessoas que nele nasceram, que nele crescem e envelhecem, que o usam para trabalhar ou para mero ócio.
Neste território, como em muitos outros, reconhecem-se contradições, mas também se reconhecem fortes valores identitários, determinantes em qualquer estratégia que se pretenda desenvolver na vida privada e na vida pública.
Há que valorizar o Território porque atua como elemento gerador de imagem e de reconhecimento de identidade
Há que valorizar o Território como suporte da Economia porque é este, com as Pessoas que o constroem e usam, que gera oportunidades de negócio e assim, converte-se em lugar de emprego e de atratividade.
Há que valorizar o Território como valor social porque é nele e sobre ele que se desenvolvem todos os projetos que contribuem para melhorar a qualidade de vida da população, desde a criança até ao idoso, desde o presunçoso ao humilde.
Procurei desenvolver alguns destes desafios durante os anos em que assumi para toda a região norte, a coordenação dos investimentos da cultura durante o III quadro comunitário, entre 2000 e 2006. Já então foi um desafio bonito e com ele aprendi muito.
Agora, em Fevereiro de 2013, decido aceitar o desafio da candidatura porque sinto que o momento é oportuno. Estamos numa altura em que a conjuntura económica já não sustenta o investimento megalómano de crescimento da rede urbana e, por isso, o proveito reside agora em passar à ação política de responsabilidade, de requalificação e de reutilização. Os próximos anos desafiam-nos a refletir sobre o novo quadro comunitário de apoio, um horizonte para 2020. Mas 2020 é já amanhã e, por isso, temos que pensar mais longe.
Sei que a arte de bem governar andou sempre ligada à arte da poupança.
O povo ironiza, mas aprecia. No poupar é que vai o ganho, dizem há muito tempo. O talento do pé-de-meia ainda grangeia respeito.
Mas há coisas em que não vale a pena passar necessidades. Não se adianta nada em economizar nas ideias. Quando existem, é usá-las. E, sempre que possível, as próprias.  
Assumir estas perspetivas parece-me coerente, não só porque conheço a capacitação endógena do território do Marco de Canaveses, mas também porque reconheço as qualidades das populações.
Para além de tudo isto, há um plano de orientação das políticas autárquicas que a Federação Distrital do Porto do Partido Socialista desenvolveu como suporte específico para a região do Baixo Tâmega e Vale do Sousa.
Agora, o empenhamento e o saber das Pessoas no Marco de Canaveses e a ajuda das estruturas concelhias, farão a alavancagem desses suportes e valorizarão a participação cívica com os seus próprios contributos.
Por tudo isto, agora, com 61 anos, com carreira longa nos quadros da administração pública, tendo concluído todas as provas académicas, desde a Licenciatura nos anos setenta, à Agregação em 2012, passando pelo Doutoramento terminado em 1995 (sempre na Universidade do Porto), senti que devia responder ao desafio de cidadania que me foi feito, com extrema cordialidade, por gente de bem.
Esta é, também, uma luta de cidadania assumida contra o silêncio. Nada é mais eloquente e perturbador que o silêncio. E, no entanto, nenhum outro ruído é tão inquietante como aquele que sobra das palavras que se não dizem.
Temos que quebrar os silêncios e salientar as nossas capacidades como povo, como gente, afirmar os lugares, as potencialidades e os recursos que nos dá a Terra-mãe e as suas gentes.
Terra–mãe e Gente que tornam o Marco de Canaveses num território desafiador, com atratividades identitárias que devem ser salientadas em qualquer plano estratégico.
Se, por exemplo, a serra da Aboboreira nos desafia a articular e complementar políticas com Baião e Amarante, em simultâneo, no Marco de Canaveses somos desafiados a desenvolver polos de atratividade sociocultural e económica como, por exemplo, aquele que é afirmado pelo granito e pelo extraordinário trabalho milenar dos pedreiros, suportado no conjunto constituído pelo Monte de Arados (com mais de 2000 anos de habitação humana), mas também pelas terras baixas com solos de boa qualidade onde foi construído (e tal não foi por acaso) há cerca de 1000 anos o estratégico mosteiro de Pendurada (ou Alpendurada) e, ainda, pelas evocações do trabalho na pedra que continua a fazer-se no século XXI e que, por isso, exige estratégias para que seja colocado nos mercados mundiais.
Do mesmo modo somos desafiados pelo polo de atratividade suportado no urbanismo da mais antiga capital do território, a cidade romana de Tongobriga, já então apoiada pela riqueza dos vales irrigados, nomeadamente do rio de Galinhas, cuja senhorialização, séculos depois, ali deixou a exuberante casa agrícola dos Arcos, contrastando com a singeleza da igreja local e com o que isso representa na análise social do território.
 Mas, em contraponto dessa singeleza, é neste polo de atratividade que integro a Igreja de Santa Maria, afirmação do final do século XX e desafio de pensamento do século XXI.
Temos também que reconhecer a atualidade que representa para a economia regional a travessia estratégica que desde o século II d.C. ligava a capital Bracara Augusta a Emérita Augusta (hoje na estremadura espanhola). Esta estrada marcou Quires com um povoado denso há 2000 anos e depois o mosteiro beneditino reorganizou aquele bom espaço agrícola, até que Vila Boa de Quires se impôs.
A mesma estrada obrigou à construção há 1900 anos de uma ponte em granito sobre o Tâmega, para além de servir e impulsionar as terras de Sunilanis, ou de Soalhães, já desde então comprovadamente ligadas ao mundo da latinidade.
Hoje, esta estrada seria considerada de interesse estratégico europeu.
Curiosamente, estas terras de Soalhães e Quires continuam a estar no mesmo eixo que liga aos itinerários principais que ajudaram a tornar os quilómetros mais rápidos, aproximando ao Aeroporto de Pedras Rubras, a Leixões, também ao Porto, à Galiza, a Castela.
E, se estes quilómetros são agora mais rápidos, espero que o mesmo aconteça com o caminho-de-ferro, pois, então, tudo será diferente para as pessoas e para a economia das zonas do Concelho que são servidas pelo comboio.
Estes são apenas alguns apontamentos que suportam o pensamento com que procurarei inovar a abordagem ao Território e às Pessoas.
Quero acreditar convictamente que tal é possível.  
São estas, genericamente, as razões porque sou candidato em Marco de Canaveses.
Em síntese, retomando o poema inicial.
Desejo que AS MÃOS DO ARQUEÓLOGO não só tragam o sol doutros séculos mas também contribuam para melhorar a vida que há no futuro.
Lino Augusto Tavares Dias
18 Fevereiro 2013

3 comentários :

  1. Caro Professor Lino Dias, as palavras de Luís Varela, na sua última frase, resumem o essencial do que posso dizer-lhe. Todavia, gostaria de desviar a tónica, dizendo que esqueça, por agora, a arqueologia e cuide da vida para que ela tenha futuro.
    Não se esqueça que este é considerado, com razão, um dos nossos concelhos mais carenciados.

    ResponderEliminar
  2. Com o apoio dos marcoenses, será o nosso presidente!

    ResponderEliminar
  3. Precisamos de alguém que valorize a nossa cultura e insira continuamente mais (base de tudo) e este candidato mostra-se capaz disso. Parabéns! :)

    ResponderEliminar

Obrigada por partilhares a tua opinião connosco!