quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

O memorando falhou por João Torres



São por todos conhecidas as circunstâncias que levaram Portugal a pedir ajuda externa, no primeiro semestre de 2011. O programa de assistência financeira, sustentado pela assinatura de um memorando de entendimento com a Troika, tinha, para nós, dois objectivos fundamentais: assegurar o financiamento do Estado e da economia e poder, de alguma forma, recolocar o país numa trajectória de crescimento económico. Foram muitos aqueles que, de imediato, evidenciaram as contradições do memorando. É claro que o crescimento económico não poderia ser alcançado com uma cartilha neoliberal obcecada com a necessidade de reduzir o peso do Estado na sociedade.
Quase dois anos volvidos sobre o início da vigência do programa de assistência financeira, importa reflectir sobre o caminho que temos trilhado, percebendo se, efectivamente, a austeridade “custe o que custar” nos está a conduzir a um cenário de consolidação das finanças públicas ou se, muito pelo contrário, nos está a afastar precisamente desse objectivo, levando a que, dia após dia, tenhamos piores condições para assumir os compromissos que honramos com os nossos credores. Os indicadores estatísticos e os mecanismos previsionais de que dispomos não deixam margem para dúvidas. A taxa de desemprego – em particular a taxa de desemprego jovem – a dívida pública e o (de)crescimento do PIB ilustram bem a gravidade do momento presente. O memorando falhou. E a direita tem obrigação de explicar aos portugueses como pode um país mais pobre assegurar melhores condições para pagar a dívida. Por mais contraditório que possa parecer, a verdade é que este foi o pressuposto da governação de direita ao longo dos últimos 20 meses. E de nada nos adiantou a antecipação do regresso aos mercados financeiros, que ficará para a história deste processo como uma vitória de Pirro. Afinal de contas, em que medida se traduziu esse facto numa melhoria da condição de vida dos portugueses?
Soluções para crises globais, com uma dimensão fortemente sistémica, não podem ser apresentadas parcelarmente. Enquanto a união económica e monetária em que estamos inseridos – bem mais monetária do que económica, sejamos francos – não proporcionar mecanismos de solidariedade entre os seus Estados-membros, que permitam um nivelamento das taxas de juro inerentes à emissão de títulos da dívida pública, as crises especulativas de que fomos alvo com particular severidade poderão continuar a acontecer no futuro, sem qualquer causalidade legítima. Ainda que a intervenção moderada do Banco Central Europeu tenha tido um efeito positivo, ainda não se construíram, nem tão pouco se vislumbram, os pilares de uma reforma europeia que, efectivamente, garanta a sustentabilidade do projecto europeu e, por conseguinte, lance alicerces para a criação de riqueza nas economias periféricas do Velho Continente.

João Torres

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