quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Sócrates é monstro ad eternum, mas...

É já considerável o período de tempo em que prolifera em mim a perceção de que José Sócrates é um monstro - para sempre e para todos os portugueses, ou nem todos - mas, e daí, talvez não seja bem assim... Adiantarei mais sobre este assunto muito brevemente no próximo texto que publicarei, porém, de momento, queria introduzi-lo recorrendo às palavras de Pedro Santos Guerreiro no seu editorial do Jornal de Negócios de 4 de Dezembro de 2012.


«A banca viveu acima das possibilidades»
Pedro Santos Guerreiro
Director
«Uma imparidade é uma desvalorização, uma provisão é uma perda e ambas são prejuízos futuros. Nos últimos cinco anos e picos, os maiores bancos em Portugal provisionaram… 16,7 mil milhões de euros. Está a perceber porque não há crédito às empresas?
As contas estão actualizadas ao dia: desde 2007 até às imparidades no crédito imobiliário e à construção anunciadas ontem pelo Banco de Portugal, BCP, CGD, BES, BPI e Santander acumularam esse valor em provisões: 16,7 mil milhões. O valor vai crescer até ao final do ano – e no próximo ano. Até quanto? 20 mil milhões não é um valor inverosímil. Se não caiu da cadeira, faça o favor de cair.
No início, a maioria das provisões respeitavam as perdas financeiras: os bancos detinham acções que se desvalorizavam em Bolsa. Hoje, a maior parte diz respeito a crédito, sobretudo no imobiliário e construção: são créditos que jamais serão pagos na totalidade. Há hoje uma incinerada de créditos, todos os dias há propostas de venda de empresas (isto é, dos seus passivos) com enormes descontos nas dívidas. Poucos lhes pegam.
Quando, no Verão do ano passado, aqui defendemos que os bancos deviam vender carteiras de crédito, ainda que com prejuízo, para “limparem” os balanços de perdas que já lá estavam, assumimos que isso levaria os bancos a necessitar de capital do Estado. O capital do Estado já entrou, como empréstimos, com a excepção do BES, que realizou um aumento de capital privado. Mas a limpeza ainda não está feita. Sê-lo-á? Dificilmente. Lamentavelmente.
Os bancos estão hoje num beco, mas a responsabilidade de lá estarem é do sistema financeiro. Taxas de juro baixas, concentração no financiamento da economia através dos bancos e falta de limites no seu próprio endividamento tiveram consequências: excesso de crédito; e de lucros. Sim, estas perdas são o reflexo de lucros antigos. O crédito que não se cobra hoje foi lucro que se distribuiu ontem. Houve lucros excessivos da banca no passado. Foram lucros falseados. A verdade completa-se agora, neste acerto de contas brutal, de “provisões” e “imparidades”.
Assim sendo, os bancos não andaram no passado a distribuir verdadeiros lucros aos seus accionistas, andaram a distribuir capital. O que é incrível é que a hipersupervisão actual tenha sido tão cega, surda e muda no passado. Ninguém foi capaz de proibir rácios de alavancagem tão altos. Foi a banca que mais viveu acima das suas possibilidades.
O Estado desorçamentou dívidas em todos os recantos. Os empresários endividaram as empresas sob o pretexto de não terem capital, embora tenham sido regularizados quase 2,8 mil milhões de euros de famílias que tinham o dinheiro escondido nas Suíças. Os particulares, que desataram a comprar casas, são os únicos inocentes: perante as taxas de juro baixas, as expectativas de rendimento e o mercado de arrendamento, comprar casa era a decisão racional. Mas agora, a bolha imobiliária que ninguém viu, mas que rebenta aos poucos nos balanços dos bancos, está a carcomer os seus activos.
Como os créditos à habitação pesam muito e foram concedidos com “spreads” demasiado baixos para a longevidade dos contratos, os novos créditos são excessivamente caros, para atenuar a média. Junte-se a isto a redução de endividamento num país em recessão e temos a armadilha em que os bancos caíram. Hoje sim, hoje são vítimas. Vítimas de si mesmos. Vítimas que fazem vítimas: trabalhadores despedidos, contribuintes que poderão tornar-se accionistas, empresas sem crédito.
As empresas, quando fecham, fecham para sempre: uma têxtil encerrada nunca mais abre; uma fábrica deslocalizada não regressa. E a razia empresarial a que estamos a assistir de Norte a Sul, sendo positiva para os economistas mais liberais que nisso vêem o fim dos “maus” de cujas cinzas medrarão os “bons”, esquecem-se que Portugal vive num ambiente impossível, em que só em custos de financiamento e de energia as empresas pagam mais uns dez pontos percentuais que os seus concorrentes externos.
É preciso financiar empresas. Sobretudo as PME, que têm sido prejudicadas face às grandes empresas (como diz hoje Jörg Asmussen, num assunto a que voltaremos). Há empresas economicamente viáveis que estão a morrer por problemas financeiros.
Como? Há várias possibilidades, dos “bancos maus” até esperarmos (sentados) pela união bancária ou que os banqueiros vendam mais crédito com prejuízo, para limpar balanços. Ou então pedir à troika que nos ajude a ter mais tempo também para a desalavancagem dos bancos. O que não é possível é sairmos da crise sem crescimento. Nem crescer sem investimento. Nem investir sem crédito. Mesmo que isso dê outra vez aos bancos o que antes eles tiveram em excesso: lucros.»
 
Em breve, mais, da minha parte, sobre este assunto. 
 

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