domingo, 2 de fevereiro de 2014

A Gaitada da Decadência - O estático movimento da mudança tranquila.

O estático movimento da mudança tranquila.
Deitar nas eleições e votar o futuro ao lixo.



            Do alto da nossa hipocrisia, pedantismo, wikipedismo e arrogância saloia abrimos mão da pena e da gabardina e vislumbramos Marco de Canaveses com uma enorme vontade de sofrer!
            “Eh-lá-hô”, estimado leitor amigo! Ora viva! Por Delphoi e pelas oliveiras onde os filósofos se estendiam falando do mundo e dos sistemas! Como vais, prezado companheiro de leitura! Co’a breca! Há que tempos não nos cruzávamos por este jardim, qual flâneur de bolso! Pois é! Depois de esta longa diáspora eleitoral, pessoal, espiritual, íntima e parola, voltamos, lavados, perfumados e de dentes escovados!
            Entramos em 2014 como quem entra numa loja de penhoras! Pelo cão! Mas deixemos, por ora, essas quase preocupações de lado e concentremo-nos num evento que transformou, muito!, a marcoense vida, sempre votada para as coisas íntimas, belas, em nome de justiça e da verdade! (Se soubesses a vontade que tenho de aqui colocar o coro do povo hebreu a interpretar parte do “Va, pensiero” , do terceiro acto de Nabucco, de Giuseppe Verdi!) Pois bem! Voltemos a 29 de Setembro, voltemos às eleições autárquicas! O concelho todo em rebuliço, os cartazes dos candidatos e dos movimentos e partidos (alguns com toneladas de ferro e lona e circo) outros com palavras e ideias e vontade de trabalhar! Mas, para nosso espanto, o povo, como sempre, votou-se nos valores da tradição! O povo “deitou” em quem já lá estava para não continuar a não-mudança, ou então a “mudança-estática”, com perdão da adaptação pessoana a estas andanças! O povo deitou o futuro ao lixo, ou ao progresso e à mudança. Nada disso! Os marcoenses estão satisfeitos por sermos o 12º pior concelho do país para se viver; os marcoenses estão satisfeitos com as obras de estética económica e humana que se fez pelo “centro da cidade”; os marcoenses estão satisfeitos por beberem água de poços que jogam cartas, de mão dada, com as fossas, pois água e saneamento é coisa de cretino, não de marcoense! Atenção, leitor amigo, pois não estamos a traçar a estética do ser marcoense, visto que esta mão também o é, para o bem e para o mal!, ainda que "estrangeirada" há uns bons anos! Na melhor das hipóteses, fazemos uma observação sociológica, wikipedista, como sempre, sob a égide de Michelet: “Diz-me em quem votaste e eu dir-te-ei quem és”. No entanto, parece que ser marcoense, ou fazer parte de 11 mil marcoenses passa por essas premissas! Ainda mal! Deitamos nos mesmos! Sim! Deitamos Marco de Canaveses pelo tubo de esgoto que não temos, abrimos a torneira da água canalizada que tarda a chegar desde sempre, para que a mudança tranquila continue! Pão e circo! Inaugurações e festas! Vinho e verborreia! E lá no fundo, em Tongobriga, os romanos que por lá andavam e andam, coitados, olham estupefactos e pasmados, enquanto se banham e têm águas públicas, pois o cardo e o decumanus mental nunca foi demais! Mas que bom que temos executivo com maioria absoluta! Assim não haverá discussões em que se tenha de falar da maçada do bom senso do apoio à cultura, à verdadeira, à que instrui, à que tem a função de “plaire et instruire” diriam os franceses e dizem os francófilos! Graças aos deuses, e aos marcoenses, que temos um executivo que não perde horas a discutir a água e o saneamento, as escolas, o transporte para estas, a assistência aos idosos, o apoio aos desempregados, o incentivo aos jovens que, cada vez mais, têm vontade de ficar pelo burgo marcoense! Aquando das eleições ouvia-se falar do cansaço “íssimo, íssimo, íssimo” para com quem estava no poder! Oh tédio filosófico-existencial! Oh Schopenhauer dos tempos modernos! Oh Simbolismo partidário de bolso e de cartaz e comício! O rebuliço das pessoas, todas elas contra o poder estabelecido, dizendo que era necessário uma nova mudança e “mundança”. Foram as ideias, vieram os candidatos! Foram surgindo, com os seus discursos, os seus projectos! Uns propunham baixar preços impossíveis de baixar; outros queriam continuar o marasmo; outros não sabiam bem o que fazer para não sair do discurso bacoco e repetitivo de tempos de latifúndio de tasca; outros queriam ser presidente à força, desse por onde desse; outro ainda falava em pôr a população a pensar, a participar activamente, não fazendo promessas, aliás, prometendo jamais fazer promessas! Esse candidato pensava e sabia ver as coisas, pois não era um indivíduo com um conta-quilómetros político de gabinete e assessoria! Esse candidato apresentava propostas, debatia, não acusava este ou aquele, não falava como um Pilatos em Jerusalém, nem como Górgias em Atenas, mas pensava e falava como um comedido e apaixonante Flávio Josefo,  Marco Aurélio, Plínio ou Horácio! Mas, porque era o candidato ideal para as marcoenses terras, pois era lúcido, consciente, coerente e apto, não era o candidato típico marcoense, não era o candidato ideal para Marco de Canaveses! Hip-hip Urra! Não ganhou as eleições! E ainda bem! Já viram o que era ter um presidente digno, honesto, trabalhador, capaz de levar o município a um outro horizonte? Graças aos céus, e aos marcoenses!, que tudo continua igual!
            Afinal de contas, o cansaço das pessoas era o da falta de promessas heroicas! Talvez promessas de que as festas se irão prolongar por 2 meses, que vamos ter o oceano Atlântico em Alpendorada e Vila Boa de Quires! Sim, só nestas duas freguesias!, pois deitam bem!, que vai haver vinho e biscoitos para todos e que vamos ter touradas mais frequentemente! Isso era o que este candidato devia ter dito e verborreado! Agora falar da necessidade da água e saneamento, da análise das águas, na aposta nos recursos endógenos, na valorização da paisagem milenar enquanto património e oferta cultural para um cidadão atento e amante das coisas belas, para quê?? Quem quer saber disso? Só mesmo quem tem a mania que é intelectual e pode mudar alguma coisa! Só algum cretino, diria Jorge de Sena!
            Mas basta, leitor amigo, basta de tanto atacarmos este candidato, pois ele não tem culpa de ser uma pessoa excepcional e que causa admiração! Ele não tem culpa de não ser cretino e de não andar com os olhos provincianamente fechados! Ele não tem culpa de ser assim, de ter esse grande defeito, digno de martírios tanto literários, quanto humanos, essa grande falta, essa grande miséria que é saber pensar, saber planear!
            Enfim, pelo cão! Graças por não termos tal homem digno e correcto como presidente da câmara! Já viram o que era assistir aos debates sem que houvesse ataques ad hominem, sem que se prolongassem verborreias infinitas, onde só se discutissem ideias e maneiras de podermos, em casa, abrir a torneira e ter água canalizada? Já viram o que era andar pelo país e dizer que éramos do Marco de Canaveses  e que tínhamos um presidente que nunca foi político? Que veio fazer o que faz falta? Um presidente que daria orgulho, brio, paixão e desejo de estar sempre e sempre a dizer que éramos de Marco de Canaveses? Porra, isso seria uma grande maçada!
            Continuamos iguais, orgulhosamente o 12º pior concelho do país para se viver! Ficar triste com isto?! Por quê?

            Vamo-nos, mas é, rir, pois!

1 comentário :

  1. Como sempre José Vieira merece o meu aplauso. Discurso frontal, assertivo e acusador sem apelo nem agravo. Coloca neste seu poste o dedo na ferida, debita e bem, todo o seu pesar, direi mesmo o seu amargor, toda uma não aceitação em viver numa sociedade marcuense, que tudo faz para não o merecer a ele, nem a outros, que sonhariam com a concretização de outros objetivos, a realização de outros anseios e o alcançar outras metas. Em resumo, dos muitos, que se envergonham da "colagem" à sua terra natal de nomes, que pela sua postura na vida política e até social, só a envergonharam, só a menosprezaram, só a amesquinharam.
    Estou consigo, amigo José Vieira
    Um abraço
    João Valdoleiros

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